Quem
gosta de ser treinador de futebol e tem o constante desejo de melhorar deve
para além da aprendizagem através dos livros, dos estágios, entre outras formas
de aprendizagem, deve também ver muitos jogos de futebol como treinador e não
como um simples espetador, já que esta é uma das melhores formas de percecionar
novas tendências evolutivas do jogo e assim escolher uma ideia ou aperfeiçoar
uma ideia de jogo favorita ou que corresponda às características dos jogadores
que orienta.
Por
isso, e para começar a falar do tema que questiono no título, quando nós
observamos um conjunto de jogos de equipas treinadas por Guardiola, Jorge Jesus
ou Lopetegui por exemplo, verificamos que de jogo para jogo, os princípios que
sustentam a sua ideia de jogo nos diferentes momentos (atacar, defender,
transitar) mantêm-se consistentes e os jogos “fluem” sem grandes oscilações de
rendimento de acordo com esses princípios.
Então
como chegar a esses modelos consistentes? Porque é que alguns treinadores
chegam a esses modelos consistentes e outros não? O que é realmente um modelo
de jogo consistente?
Em
primeiro lugar, é fundamental uma apresentação teórica e de uma forma simplista
das grandes ideias da tua forma de jogar a atacar, defender e nos momentos de
perda e recuperação da bola. O uso de frases, vídeos de equipas-modelo,
esquemas, etc. parece-me uma excelente forma dos jogadores entenderem aquilo
que se pretende para a forma de jogar.
Em
segundo lugar, o treinador deve construir um processo de treino planeado para
chegares ao tal modelo de jogo consistente. Como construir? Quais os passos?
1-
Operacionalização (treinos/exercícios) inicial com incidência total na tua
forma de jogar, e nas fases do jogo em que o treinador dá mais importância no
seu modelo de jogo, com o objetivo claro de os atletas tomarem consciência e
posteriormente um hábito adquirido (subconsciência) dos comportamentos
coletivos e individuais da sua equipa. É óbvio que este processo pode demorar
semanas ou meses ou pode mesmo não acontecer;
2-
Depois de consolidares a tua forma de jogar e os teus jogadores
subconscientemente praticarem aquilo que se quer, o treinador deve tirá-los da
“zona de conforto” que é a sua forma habitual de jogar e provocar dificuldade,
complexidade aumentada, variabilidade na operacionalização. Como? Provocar no
treino aquilo que as equipas adversárias vão tentar fazer para derrotar o nosso
modelo vitorioso/consistente e provocar no treino a grande imprevisibilidade
que o jogo pode ter dentro da previsibilidade que se quer que seja a tua forma
de jogar;
Depois,
existe um fator que será talvez o mais importante na construção de modelos
consistentes que é o facto de a ideia do treinador só ser bem-sucedida se
treinada e se criar emoções positivas nos jogadores, isto é, os jogadores têm
de acreditar naquilo que fazem para a aprendizagem acontecer, o comportamento
tornar-se um hábito consciente e depois subconsciente. Eu escrevo à direita
porque me habituei a escrever com essa mão e fui bem sucedido e tive a minha
mãe a motivar-me, se eu começar a escrever à esquerda, habituar-me e se me
derem um feedback ainda mais positivo e motivador do que a minha mãe me dava eu
começo a acreditar que escrevo melhor à esquerda. Portanto é preciso crença,
aceitação e sucesso na ideia de jogo do treinador.
Como treinador considero estes os passos
essenciais para a construção de um modelo de jogo consistente que normalmente
não acontecem na grande maioria das equipas porque o problema está na
operacionalização referida acima e na dificuldade em criar uma relação
treinador-atleta positiva e emocional. Essencialmente, os treinadores “dão
passos maiores que a perna” na operacionalização inicial, não consolidando
comportamentos ora porque são pressionados com resultados ora porque se
pressionam a si próprios e aos seus jogadores por quererem jogar o seu “jogar”
em 1-2 treinos ou 1-2 semanas. Se a direção do Barcelona fosse “resultadista” e
se Pep Guardiola não continuasse crente e fizesse acreditar aos seus jogadores
que era possível chegar ao suposto tiki-taka não teríamos chegado ao melhor
futebol de todos os tempos (a minha opinião) e teríamos Guardiola despedido à
4ª ou 5ª jornada.
Para
finalizar o que são realmente modelos de jogo consistentes? Na minha opinião
são aqueles que ganham mais jogos mas principalmente são aqueles que em
momentos cruciais de uma época estão preparados a todos os níveis, seguindo uma
ideia de jogo clara e adaptando-se constantemente às dificuldades que o
adversário lhes poderá colocar. Um exemplo que vos posso dar é o de Pep
Guardiola no Bayern que é apenas o treinador mais titulado do mundo na última
década e que revolucionou o jogo. Será que a sua equipa estava preparada para a
eliminatória da Liga dos Campeões em que o Bayern foi eliminado pelo Real
Madrid de forma categórica nas meias-finais em 2013/2014 (vitória do Real 1-0
em casa e vitória 4-0 fora)? Na minha opinião não porque o Bayern tinha uma forma
de jogar bastante consolidada (operacionalização em função da sua ideia) mas
depois não promoveu contextos de treino que adaptassem essa forma de jogar
aquilo que seria o Real Madrid nesses jogos. Nesse dia, e sendo Pep Guardiola
um treinador tão perfecionista, ele percebeu que o seu modelo de jogo não era
totalmente consistente.
E daí falarmos em modelos inacabados, em
constante evolução!
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