quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Como criar um modelo de jogo consistente?




Quem gosta de ser treinador de futebol e tem o constante desejo de melhorar deve para além da aprendizagem através dos livros, dos estágios, entre outras formas de aprendizagem, deve também ver muitos jogos de futebol como treinador e não como um simples espetador, já que esta é uma das melhores formas de percecionar novas tendências evolutivas do jogo e assim escolher uma ideia ou aperfeiçoar uma ideia de jogo favorita ou que corresponda às características dos jogadores que orienta.


Por isso, e para começar a falar do tema que questiono no título, quando nós observamos um conjunto de jogos de equipas treinadas por Guardiola, Jorge Jesus ou Lopetegui por exemplo, verificamos que de jogo para jogo, os princípios que sustentam a sua ideia de jogo nos diferentes momentos (atacar, defender, transitar) mantêm-se consistentes e os jogos “fluem” sem grandes oscilações de rendimento de acordo com esses princípios.




Então como chegar a esses modelos consistentes? Porque é que alguns treinadores chegam a esses modelos consistentes e outros não? O que é realmente um modelo de jogo consistente?
Em primeiro lugar, é fundamental uma apresentação teórica e de uma forma simplista das grandes ideias da tua forma de jogar a atacar, defender e nos momentos de perda e recuperação da bola. O uso de frases, vídeos de equipas-modelo, esquemas, etc. parece-me uma excelente forma dos jogadores entenderem aquilo que se pretende para a forma de jogar.
Em segundo lugar, o treinador deve construir um processo de treino planeado para chegares ao tal modelo de jogo consistente. Como construir? Quais os passos?


1- Operacionalização (treinos/exercícios) inicial com incidência total na tua forma de jogar, e nas fases do jogo em que o treinador dá mais importância no seu modelo de jogo, com o objetivo claro de os atletas tomarem consciência e posteriormente um hábito adquirido (subconsciência) dos comportamentos coletivos e individuais da sua equipa. É óbvio que este processo pode demorar semanas ou meses ou pode mesmo não acontecer;

2- Depois de consolidares a tua forma de jogar e os teus jogadores subconscientemente praticarem aquilo que se quer, o treinador deve tirá-los da “zona de conforto” que é a sua forma habitual de jogar e provocar dificuldade, complexidade aumentada, variabilidade na operacionalização. Como? Provocar no treino aquilo que as equipas adversárias vão tentar fazer para derrotar o nosso modelo vitorioso/consistente e provocar no treino a grande imprevisibilidade que o jogo pode ter dentro da previsibilidade que se quer que seja a tua forma de jogar;






Depois, existe um fator que será talvez o mais importante na construção de modelos consistentes que é o facto de a ideia do treinador só ser bem-sucedida se treinada e se criar emoções positivas nos jogadores, isto é, os jogadores têm de acreditar naquilo que fazem para a aprendizagem acontecer, o comportamento tornar-se um hábito consciente e depois subconsciente. Eu escrevo à direita porque me habituei a escrever com essa mão e fui bem sucedido e tive a minha mãe a motivar-me, se eu começar a escrever à esquerda, habituar-me e se me derem um feedback ainda mais positivo e motivador do que a minha mãe me dava eu começo a acreditar que escrevo melhor à esquerda. Portanto é preciso crença, aceitação e sucesso na ideia de jogo do treinador.




Como treinador considero estes os passos essenciais para a construção de um modelo de jogo consistente que normalmente não acontecem na grande maioria das equipas porque o problema está na operacionalização referida acima e na dificuldade em criar uma relação treinador-atleta positiva e emocional. Essencialmente, os treinadores “dão passos maiores que a perna” na operacionalização inicial, não consolidando comportamentos ora porque são pressionados com resultados ora porque se pressionam a si próprios e aos seus jogadores por quererem jogar o seu “jogar” em 1-2 treinos ou 1-2 semanas. Se a direção do Barcelona fosse “resultadista” e se Pep Guardiola não continuasse crente e fizesse acreditar aos seus jogadores que era possível chegar ao suposto tiki-taka não teríamos chegado ao melhor futebol de todos os tempos (a minha opinião) e teríamos Guardiola despedido à 4ª ou 5ª jornada.

Para finalizar o que são realmente modelos de jogo consistentes? Na minha opinião são aqueles que ganham mais jogos mas principalmente são aqueles que em momentos cruciais de uma época estão preparados a todos os níveis, seguindo uma ideia de jogo clara e adaptando-se constantemente às dificuldades que o adversário lhes poderá colocar. Um exemplo que vos posso dar é o de Pep Guardiola no Bayern que é apenas o treinador mais titulado do mundo na última década e que revolucionou o jogo. Será que a sua equipa estava preparada para a eliminatória da Liga dos Campeões em que o Bayern foi eliminado pelo Real Madrid de forma categórica nas meias-finais em 2013/2014 (vitória do Real 1-0 em casa e vitória 4-0 fora)? Na minha opinião não porque o Bayern tinha uma forma de jogar bastante consolidada (operacionalização em função da sua ideia) mas depois não promoveu contextos de treino que adaptassem essa forma de jogar aquilo que seria o Real Madrid nesses jogos. Nesse dia, e sendo Pep Guardiola um treinador tão perfecionista, ele percebeu que o seu modelo de jogo não era totalmente consistente. 
 
E daí falarmos em modelos inacabados, em constante evolução!




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