Hoje
em dia fala-se muito na falta das brincadeiras na rua ou no “campo do bairro” e
como isso prejudica a imaginação dos jovens futebolistas. Que o treinador tem
que trazer o futebol de rua para o treino e que deve dar liberdade aos seus
jogadores para “darem asas” à sua imaginação.
Eu
concordo plenamente com esta linha de pensamento. Não só agora, mas desde
sempre. O que acredito acima de tudo é que os treinadores não devem desvirtuar
o jogo durante o treino, em cada exercício o futebol (o jogo) deve estar
presente e nunca ir contra a sua essência.
Muitos treinadores de formação tentam
implementar um tipo de jogo de posse, em que privilegiam o passe curto, poucos
toques na bola e que tem como objetivo chegar ao golo de forma segura e
organizada. Para isso fazem muitos exercícios com limites de toques (3, 2 e às
vezes até 1), muitos jogadores de equipas seniores não tem capacidade
técnico-tática para fazer um exercício destes com qualidade, um jogador
benjamim ou infantil vai ter? Muitas vezes obriga-os a fazer movimentações e
posições corporais pouco ortodoxas e que nada têm a ver com o jogo, 3 toques
muitas vezes é o que necessitam para receber uma bola com qualidade. Tira-lhes
criatividade porque não podem fazer um drible, ou receber orientado e levantar
a cabeça para fazer um passe de rutura. Mas fundamentalmente, tira-lhes a
possibilidade de cumprirem o princípio da progressão, tendo espaço para a
baliza não podem progredir para o golo porque têm uma limitação de toques. Faz
sentido?

Outro
tipo de exercício que vejo muito frequentemente é a obrigatoriedade de variação
do centro de jogo, onde a equipa precisa de ir a um apoio lateral e ao outro
antes de ir para a baliza. Mais uma vez estamos a limitar a criatividade dos
jogadores, que não podem ganhar a bola e fazer rapidamente um remate ou
descobrir um último passe, muitas vezes ganham bola na posição central e em vez
de irem para a baliza como seria espetável têm que ir aos apoios.
Este
tipo de exercícios limita a criatividade dos jogadores e cria-lhes hábitos
muito difíceis de tirar mais tarde e que deturpam a sua interpretação do jogo.
O objetivo é que os nossos jogadores percebam o jogo e tomem uma boa decisão em
função do que está a acontecer naquele momento. Têm que ter o poder de escolha
como no jogo, e quanto mais escolhas mais próximo do jogo estaremos.
Uma
forma de contornar a situação dos apoios seria duplicar ou triplicar a
pontuação sempre que haja golo depois de uma variação do centro de jogo. Existe
a escolha, eu posso ir para a baliza e marcar logo ou variar o jogo.
Inicialmente vão haver menos variações, mas eles vão percebendo que lhes trás
vantagem e o objetivo do treinador vai aparecendo aos poucos.
Quanto
ao limite de toques parece-me que só será boa opção se for para limitar um
apoio ou joker, quando queremos que joguem de forma mais rápida e diminuam a
condução com bola; criar inferioridade numérica e aumentar por exemplo os
apoios por fora permite-nos essa dinâmica. Os exercícios serão muito mais
apelativos para os jovens e haverá mais magia no treino!
Horst
Wein tem um artigo bastante interessante sobre este assunto chamado “How to
Develop Creative Players”. Neste artigo ele apresenta-nos algumas dicas de como
poderemos tornar os nossos jogadores mais criativos e algumas razões para eles
terem cada vez menos essa capacidade. Sumariamente:
- “Declarar guerra ao 11vs11” – Segundo Wein o jogo a 11 não permite aos jogadores jovens intervir vezes suficientes para utilizarem a sua criatividade e fazerem coisas diferentes;
- “Deixar os jogadores jogar sem correção constante” – A correção constante aumenta a pressão sobre os jogadores, devem jogar o jogo pelo jogo e não sempre com objetivos impostos pelo treinador;
- “Insistir que todos os jogadores jogam em todas as posições e em espaço reduzido” – Cada posição tem funções e relações diferentes com os colegas e com as zonas do campo, os jogadores devem passar pelas experiências mais variadas possíveis;
- “Lembrar que apenas os que se divertem conseguem ser criativos” – a imposição de objetivos e padrões de comportamento produz conhecimento rígido que bloqueia a liberdade de pensamentos e movimentos;
- “Deixar os jogadores criar os seus próprios jogos e regras” – durante uma pequena parte do treino dar aos jogadores um tempo para inventarem um jogo ou fazerem o jogo que gostam mais, aumenta a sua imaginação, o seu sentido de responsabilidade e a sua capacidade de iniciativa;
- “Desafiar os jogadores a correr riscos e melhorar sem temer consequências” – jogadores jovens dos 7 aos 12 anos não devem pressionados para passar a bola, devem ter permissão para “estar apaixonados pela bola” para melhorar a sua relação com a bola e tomarem riscos sem temer consequências.
Sem comentários:
Enviar um comentário